A noite de novembro tinha uma magia particular. A luz suave dos postes de rua mal conseguia vencer o frio, e o vento brincava com os primeiros flocos de neve que dançavam no ar como pequenas estrelas cadentes.
Gál Lilla e seu marido, Miklós, voltavam lentamente para casa, depois de um jantar de aniversário na casa de amigos. Caminhavam de braços dados, envoltos em um silêncio quase sagrado.
— Olhe só essa neve… parece um conto de fadas — suspirou Lilla, agarrando-se mais ao braço do marido.
— Sim… maravilhoso — respondeu Miklós com um sorriso suave. — Silêncio, paz… Finalmente uma noite tranquila.
Mas aquela paz foi abruptamente interrompida por um som agudo. Um choro. Fraco, mas insistente.
— Espere um pouco… — disse Lilla, parando de repente. — Você ouviu isso?
— Sim… É um bebê chorando! — Miklós arregalou os olhos e virou a cabeça para identificar de onde vinha o som.
— Quem sairia para passear com um bebê nesse frio? — sussurrou Lilla, intrigada e preocupada.
Apurando os ouvidos, seguiram o som. Chegaram a um banco parcialmente coberto de neve. E ali… uma pequena trouxa. Inerte. Coberta por um cobertor rasgado e empapado de neve. Miklós se abaixou e puxou o tecido com cuidado.
— Meu Deus, Lilla… É um bebê!
Lilla correu e, com as mãos tremendo, tomou o pequeno corpo nos braços. Era uma menina. Estava congelando.
— Uma menininha… completamente gelada… — sussurrou com os olhos marejados. — Como alguém pode ser tão cruel?
— Vamos levá-la para casa. Imediatamente! — disse Miklós, decidido.
Já em casa, ligaram o aquecedor ao máximo. Lilla, como por instinto, começou a cuidar da pequena. Retirou o cobertor molhado, limpou com delicadeza cada dedinho, cada pedacinho de pele.
— Miklós, vá à farmácia agora. Precisamos de leite, mamadeira, fraldas… o que conseguir. Rápido!
Sem hesitar, Miklós pegou o casaco e saiu porta afora.
A bebê chorava de frio, os mãozinhas e pezinhos roxos. Lilla a envolveu com seu próprio suéter e a embalou com ternura.
— Tudo bem, meu amor… estou aqui… ninguém vai te machucar…
Miklós voltou em quinze minutos com uma montanha de sacolas.
— Trouxe três tipos de fraldas descartáveis, não sabia qual seria melhor… — disse, ofegante.
— Está perfeito. Venha, me ajude — respondeu Lilla com um sorriso emocionado.
Alimentaram a pequena com o leite morno. Ela mamava com voracidade. Lilla não conteve as lágrimas.
— Tão faminta… Quem sabe há quanto tempo estava sozinha…
Miklós a olhou com ternura, mas também com preocupação.
— Amanhã teremos que informar as autoridades. Isso é sério.
Lilla assentiu, relutante, acariciando o rostinho adormecido.
— Eu sei… mas parece… parece que ela já é nossa.
Na manhã seguinte, a porta se abriu para dois visitantes sérios: o sargento Jeges e Éva Varga, da assistência social.
— Gál? Recebemos a notícia de que encontraram uma criança ontem à noite?
Miklós confirmou, narrando os detalhes. Éva se aproximou do bebê com cuidado. Ela sorriu ao ver o bom estado da criança.
— Está bem cuidada. Mas infelizmente, terei que levá-la.
— Não… — murmurou Lilla, mas já era tarde. A menina começou a chorar quando foi tirada dos seus braços. Lilla soluçava.
— Vamos perdê-la… — sussurrou.
— Talvez não — respondeu Miklós, firme. — Podemos tentar adotá-la. Vamos lutar por ela.
Naquela noite, conversaram longamente. Relembraram os anos de tentativas frustradas, os exames, as perdas. E agora, um milagre.
— Se ela está aqui… deve haver um motivo — disse Lilla, fitando o berço antigo, que ainda guardavam.
— Amanhã daremos entrada no pedido. Vamos fazer de tudo.
Passaram-se três meses. As investigações não encontraram os pais biológicos. A pequena, agora chamada Zsófi, se tornou adotável. Lilla e Miklós foram os primeiros a entrar com o processo.
Éva os visitou várias vezes. Ficou impressionada com a dedicação e o amor do casal.
— Vocês são pais ideais. Tudo está a favor de vocês. Mas o processo leva tempo.
— Por favor, Éva… — pediu Lilla, com os olhos brilhando de esperança. — Ela é nossa filha de coração. Não imaginamos mais a vida sem ela.
Éva assentiu. Já vira muitos casos, mas raros com tanta entrega.
Então chegou o telefonema tão esperado.
— Boa tarde, aqui é Varga Éva. Tenho uma excelente notícia. A adoção foi aprovada. Zsófi agora é oficialmente sua filha.
Lilla desabou em lágrimas no ombro do marido.
— Ela é nossa, Miklós! Nossa menina!
Zsófi cresceu rodeada de amor. Lilla largou o trabalho e se dedicou à maternidade. Miklós manteve a estabilidade financeira com sua carreira de consultor.
Zsófi era brilhante. Curiosa, doce, generosa. Na escola, era adorada. No ensino médio, os professores diziam:
— Essa menina vai ser uma professora brilhante!
Ela acreditava nisso. E terminou o colégio com mérito e medalha de ouro.
Na noite do baile de formatura, Lilla observava a filha com orgulho:
— Olhe para ela, Miklós… parece que foi ontem que a encontramos no banco de parque.
— Acho que foi naquele momento que nossa vida realmente começou.
Enquanto jantavam, uma batida forte interrompeu a paz.
— Quem seria a essa hora? — perguntou Lilla.
Miklós abriu a porta. O sorriso desapareceu instantaneamente.
Do outro lado, um casal maltrapilho. A mulher com roupas rasgadas e rosto marcado pela bebida. O homem, sujo e desequilibrado.
— Aí está você, minha menina! — exclamou a mulher, invadindo a casa.
— Você é nossa filha. Nosso sangue! — acrescentou o homem.
Zsófi se levantou, assustada.
— Quem são vocês?!
— Somos seus pais! Sua mãe e seu pai verdadeiros! — respondeu a mulher.
Zsófi recuou, pálida.
Miklós se colocou entre eles.
— Saiam da minha casa. Estão embriagados e…
— Cala a boca! — gritou a mulher. — Ela é nossa! Temos direito!
— Direito?! — a voz de Lilla tremeu. — Direito vocês perderam quando a deixaram sozinha numa noite gelada, num banco de parque!
E naquele momento, a história deu uma nova reviravolta… mas uma coisa era certa: Lilla e Miklós não iriam desistir de Zsófi. Nunca mais.