Há três anos, minha vida foi dividida em duas partes irreconciliáveis.
Uma parte pertencente ao passado — a vida que eu tinha com minha esposa, Julia, e nossa filha, Belle. A outra, marcada pela dor insuportável da perda e pela imensa solidão que tomou o lugar delas, um vazio profundo que nunca seria preenchido.
Mas, ao menos, eu ainda tinha Ethan, meu filho de nove anos. Ele foi a razão pela qual continuei a me levantar todas as manhãs, apesar de me sentir muitas vezes pequeno e sem forças para seguir em frente. Ele ainda era a minha luz, o meu maior presente neste mundo escuro.
O tempo não foi gentil conosco, mas as fotos que eu tirava sempre me davam um pouco de alívio. Fotografar me permitia criar uma distância, uma separação entre mim e a dor.
Às vezes, eu levava Ethan comigo para minhas viagens de trabalho. Ele adorava a natureza, e quando minha mãe não podia cuidar dele, não podia deixá-lo com estranhos.
Era uma combinação de trabalho e pai dedicado.
«Filho, você precisa fazer sua lição de casa no mesmo dia, entendeu?» Eu disse uma noite enquanto preparava macarrão para o jantar. «Se você fizer isso, podemos viajar juntos no fim de semana. Que tal?»
Ethan me olhou com um sorriso largo e travesso.
«Claro, pai. E quem sabe você me ajuda a fazer mais rápido?» Ele perguntou com aquele sorriso de sempre.
Aquela viagem seria a que mudaria tudo. Uma viagem simples, a trabalho. Uma floresta distante, não muito longe da cidade, onde uma lagoa calma esperava para ser fotografada. Um lugar perfeito, com águas cristalinas, cercado por altas árvores de pinho.
“Papai, esse lugar é muito bonito,” Ethan comentou, observando ao redor.
Eu estava ajustando a câmera perto da margem quando Ethan, com seu habitual entusiasmo, começou a coletar galhos e atirar pedras na água. A floresta estava serena, os pássaros cantavam e as folhas sussurravam ao vento, criando uma paz quase mística ao redor.
Por um momento, me peguei pensando em Julia e Belle, como elas estariam se estivessem conosco. Imagino que Julia teria ficado em casa com as meninas, esperando para preparar o jantar quando voltássemos.
«Sente-se, Andrew,» ela diria. «Ethan, pegue a bolsa do seu pai. E venha comer!»
Eu sorri, ao mesmo tempo que ajustava o foco da câmera, até que, de repente, a quietude ao meu redor ficou estranhamente densa. A voz de Ethan, que até então tinha sido uma constante alegria, desapareceu.
«Ethan?» Chamei, erguendo a cabeça, à espera de vê-lo perto de mim. Mas o lugar onde ele estava brincando agora estava vazio.
«Ethan! Filho!» Gritei, procurando em volta.
Minha voz ecoou pela lagoa, mas não obtive resposta.
O medo me envolveu instantaneamente. Eu não podia perder meu filho também. Não assim.
Corri para a margem, meu coração batendo acelerado, e comecei a procurar por ele entre as árvores.
«Ethan!» Gritei novamente, minha voz mais urgente desta vez. Mas tudo o que eu ouvi foi o som das árvores balançando ao vento.
Com mãos trêmulas, eu puxei meu celular para tentar ligar para ajuda. Lembrei-me de um pequeno acampamento na entrada da floresta. Talvez eles soubessem o que fazer.
«Merda,» murmurei. «Como fui tão irresponsável?»
Infelizmente, sem sinal de rede.
A floresta parecia se expandir infinitamente, engolindo-me na sua imensidão.
Eu corri por mais de meia hora, gritando o nome de Ethan, meu pensamento uma mistura frenética de medo e desespero. E se ele se machucou? E se ele se perdeu de verdade?
Então, finalmente, ouvi a voz dele.
— Papai!
Era fraca, mas clara o suficiente para me dar esperança. Meu peito se aliviou por um momento, e eu segui o som, quebrando galhos e me arranhando pelas árvores.
Quando o encontrei, ele estava parado entre dois grandes pinheiros, com os olhos arregalados, fixos em algo à frente.
Eu queria gritar com ele, queria dizer-lhe o quanto ele me assustou, mas as palavras morreram em minha garganta.
— Ethan! Gritei, caindo de joelhos. — O que você estava pensando? Me fez passar o pior susto da minha vida!
— Me desculpe, papai, ele disse, a voz tremendo. — Mas eu encontrei algo. Uma casa. E eu ouvi uma criança chorando lá dentro.
Eu o olhei, surpreso e sem saber se tinha entendido certo.
— Uma criança? Você tem certeza?
Ele acenou com a cabeça e agarrou minha manga.
— Vem, eu vou te mostrar!
Eu queria fazer mais perguntas, mas a urgência na sua voz não me deixou tempo. Ele se virou e começou a andar rapidamente entre as árvores, e eu o segui, lutando para manter o ritmo de seus pequenos pés rápidos.
Dez minutos depois, atravessamos a vegetação espessa e chegamos a uma clareira. A casa estava no centro, desmoronando, como se a própria floresta estivesse tentando tomá-la de volta.
As tábuas de madeira estavam torcidas e envelhecidas, e o telhado coberto de musgo ameaçava desabar a qualquer momento.
Uma janela estava quebrada, e a porta balançava fracamente em seus batentes. Do interior, um som abafado de choro chegou até nós.
Ethan me olhou, com o rosto pálido.
— Viu? Eu não menti! Eu não inventei nada!
Eu engoli em seco e caminhei em direção à casa, colocando a mão no ombro de Ethan.
— Fique perto de mim, filho, falei suavemente.
A porta rangeu quando a empurrei. O cheiro de madeira velha e úmida invadiu minhas narinas.
Dentro, o lugar era rudimentar. Um pequeno banco, duas cadeiras e uma lareira cheia de cinzas. Em um canto, uma mulher estava sentada sobre um colchão gasto, segurando um bebê no colo.
Quando entramos, ela levantou os olhos, seu rosto pálido e cansado, mas não hostil. Seu cabelo escuro caía sobre o rosto, e seus olhos estavam tão exaustos quanto os de qualquer mãe que enfrentasse dificuldades sem fim.
O bebê no seu colo estava quieto, com o rosto pressionado contra o peito da mãe, tentando se acalmar entre soluços abafados.
— Quem são vocês? — A mulher perguntou, a voz baixa, quase em um suspiro. — O que estão fazendo aqui? Não temos nada para oferecer!
— Eu sou Andrew, eu disse, levantando as mãos em sinal de paz. — Este é meu filho, Ethan. Nós ouvimos… achamos que alguém precisasse de ajuda.
Ela soltou um suspiro profundo, e suas costas se curvaram de alívio.
— Desculpe, eu não queria assustar ninguém. Ela tem chorado o dia todo, e eu… — Sua voz falhou. — Eu faço o meu melhor. Não tenho muito para oferecer, mas faço tudo o que posso.
— Está tudo bem, falei suavemente. — Minha filha também tinha seus dias difíceis, quando parecia que a única resposta era o choro.
Ela hesitou, mas finalmente assentiu.
— Esta era a casa do meu avô. Ele faleceu há anos. Mas é tudo o que tenho. Meu marido… — Ela se calou, olhando o bebê em seus braços.
— Ele nos expulsou. Disse que não queria mais ser pai nem marido. Mas tenho certeza de que já estava com outra no trabalho.
Suas palavras me atingiram como um soco. Como alguém pode fazer isso? Como pode abandonar a esposa e a filha assim?
— Eu tentei, de alguma forma, me manter de pé, disse ela. — Eu costuro. Faço toalhas, cachecóis, o que eu posso. Vendo em mercados de pulgas. Mas não é o suficiente. Só quero garantir que minha filha tenha comida e que ela se mantenha aquecida.
As lágrimas começaram a cair de seus olhos, mas ela rapidamente as enxugou.
— Papai, Ethan sussurrou, puxando minha mão. — Não podemos deixá-las aqui.
Eu olhei para eles, para como a mulher segurava seu filho com tanto carinho, para como a criança se aninhava ao peito dela. A cena apertou meu coração como um nó.
Eu vi Julia em seus olhos cansados, vi Belle no jeito como o bebê se aconchegava à mãe.
— Elas não podem ficar aqui, eu disse antes de perceber o que estava fazendo. — Elas vão vir com a gente. Pelo menos até que encontremos uma solução.
A mulher nos olhou, surpresa e cheia de dúvida.
— Eu não posso! Vocês nem nos conhecem! Não sabemos nada sobre vocês!
— Eu sou fotógrafo, eu expliquei. — Foi por isso que estávamos na floresta. Eu estou trabalhando em um projeto perto do lago. Minha esposa e minha filha morreram em um acidente de carro.
Ethan é a maior bênção da minha vida. Eu não tenho muito a oferecer, mas vou fazer o que puder.
Ethan segurou minha mão com firmeza.
— Pai, nós podemos ajudá-los. Eu sei que podemos.