„Um ex-presidiário salvou uma mulher grávida do rio gelado – e na manhã seguinte, a vila ficou em silêncio…”

ENTRETENIMENTO

Károly não conseguiu dormir naquela noite. A dor aguda nas suas costas era como se uma serra enferrujada estivesse roendo a sua coluna, e ele sentia que a velha ciática havia retornado, como uma sombra negligenciada, impossível de dissipar.

Se não fosse pela poção de Piroska, que ele tomava em segredo, Károly talvez não conseguisse nem se mover.

Mesmo assim, de alguma forma, gemendo, se apoiando na parede, ele conseguiu se levantar e cambaleou até a janela.

Olhou lá fora. Não se surpreendeu. A dor indicava o tempo com mais precisão do que qualquer previsão meteorológica.

— Se dói as minhas costas, vai chover — murmurou consigo mesmo, enquanto a chuva já caía em grandes gotas, como se o mundo inteiro tivesse se transformado em um lençol molhado.

As trilhas da floresta estavam transformadas em um mar de lama, e entre as árvores, o frio e a umidade espreitavam. Károly olhou para o seu cachorro Vitéz, que estava deitado diante da lareira.

— E aí, velho? Você também não quer trabalhar hoje, né? — perguntou ele, enquanto o cachorro, que vivia com ele há anos, olhou com interesse.

Vitéz não respondeu, apenas balançou o rabo por um instante. Se o dono fosse, ele também iria.

Vitéz era uma sombra cinza na vida de Károly. Semanas antes de encontrá-lo, o cachorro estava caído à beira da floresta, sangrando e quebrado.

Um javali o havia atacado, destruindo-o completamente, mas mesmo assim, ele não gemeu. Apenas ficou ali, exausto de sua sorte, esperando que o fim chegasse.

Os outros caçadores não quiseram levar o cachorro ferido – para eles, já bastava a própria vida. Mas Károly era diferente. Certa manhã, ele saiu e o trouxe.

Deu-lhe comida, o cobriu e o levou para casa, como se toda a floresta estivesse em silêncio. «Você vai se chamar Vitéz», disse a ele, quando o acariciou pela primeira vez.

Embora tivesse ficado manco para sempre, seus instintos de caça não diminuíram. Até hoje, ele sentia quando algo se movia nas proximidades, seja um coelho, um esquilo ou um misterioso lobo.

Károly vivia sozinho, porque sua esposa, Rozália, havia morrido anos atrás – seu coração não aguentou o peso da vida.

Sua filha, Eszter, que sempre fora considerada a mais bela moça da aldeia, os abandonou. Károly frequentemente dizia:

— Ela não queria o leite fresco, o strudel caseiro, o calor do fogão — resmungava. — Ela queria o brilho, o champanhe, as luzes, a atenção dos homens.

Eszter foi embora e nunca mais voltou. Um dia, na manhã do seu casamento, ao invés do vestido de noiva, ela pegou um trem e deixou o noivo, a família, tudo o que Károly e Rozália lhe deram.

Depois, Eszter se mudou para Budapeste, trabalhou, casou, divorciou, casou novamente e se divorciou outra vez. Não queria filhos e preencheu os anos com abortos.

Os pais sempre ajudaram, apoiaram-na, deram-lhe todo o seu dinheiro, mas em resposta, só havia silêncio.

Rozália morreu chorando. Ela só queria uma coisa: ver a filha uma última vez. Károly fez tudo o que pôde, mas a filha nunca voltou.

— Se ela não se importa conosco, eu também não me importo com ela — disse ele, desesperado. Assim, ele ficou sozinho, com apenas o fiel Vitéz ao seu lado.

Uma noite, uma visita chegou à sua casa. O comissário da região, Gábor, e um homem sério e oficial, juntamente com um jovem, estavam à porta.

— Boa noite, Károly — cumprimentou Gábor, enquanto entravam. — Precisamos conversar.

Károly os deixou entrar, fez chá, tirou um pouco de mirtilo caseiro e os biscoitos habituais.

Gábor estava visivelmente contente com o calor, mas o homem oficial parecia tenso, enquanto o jovem parecia acabado, como alguém que acabara de sair da prisão.

— Este é Zoltán — começou o homem oficial. — Ele não tem grandes problemas, mas tem um passado. Já esteve preso, mas não foi por algo grave. Agora estamos trabalhando para que pessoas como ele voltem à sociedade.

O senhor Károly, talvez por compaixão ou curiosidade, não hesitou.

— Tudo bem — disse ele. — Se o meu cachorro aceitar, eu também aceito.

Depois que os oficiais foram embora, Zoltán ficou.

As primeiras semanas foram difíceis. Zoltán não sabia como a casa funcionava, como preparar o chá ou como se comportar com um idoso que não estava bravo, apenas… atento.

Károly não fazia perguntas. Estava lá, quieto, como um carvalho na borda da floresta: seguro, forte e confiável.

— Se tiver alguma dúvida, pergunte! — disse-lhe. — Não existe pergunta idiota, só silêncio idiota.

Zoltán perguntou. Primeiro com medo, depois com mais coragem, e, por fim, juntos caçaram, aprenderam as trilhas dos animais e se tornaram mais próximos do que jamais imaginariam.

Um dia, quando a neve já cobria grosso os caminhos, partiram para a floresta. Károly ia à frente, Zoltán um pouco atrás, e Vitéz corria na frente deles.

De repente, o cachorro começou a latir ferozmente.

— Isso não é brincadeira — disse Károly, enquanto pegava a espingarda.

Quando chegaram, uma cena surpreendente os aguardava. Uma jovem loba estava deitada na neve, com uma das patas dianteiras presa em uma armadilha enferrujada.

O cachorro, as árvores e o tempo apontavam todos para a mesma direção.

A loba estava sofrendo. Károly falou com suavidade, como se a própria floresta escutasse: — Não tenha medo, garota. Vamos te libertar.

E assim foi.

Quando a loba se afastou livremente, Károly sorriu. Sentiu que algo novo começava ali.

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