Marianna passou a noite inteira acordada, deitada como uma sombra que não tinha lugar no mundo.
A cama velha rangia, e o cobertor de lã, que ela mesma teceu há vinte anos, agora mostrava os sinais das mãos duras do tempo.
No teto, manchas úmidas gritavam, como se fossem ecos das memórias passadas, esticando-se pelo céu, e tudo isso se tornava um peso cada vez mais insuportável sobre seu peito.
O telefone vibrou suavemente, despertando pensamentos mais profundos. Seus dedos tremiam de desespero ao atender, e a voz de seu filho, André, soou cansada, mas implacável, do outro lado da linha.
– O que foi, mãe? – perguntou, como se já soubesse a resposta.
– Filho… não comi nada desde ontem… você tem alguns trocados para o pão? – sussurrou Marianna, sua voz enfraquecendo a cada palavra que saía de sua garganta.
A vergonha e a humildade a invadiram. A fome doía, mas o humilhante era pior do que tudo.
– Mãe, agora não posso! – gritou André, sua voz carregada de cansaço e raiva reprimida. – Estou ocupado. Ligo depois! – E desligou o telefone.
Marianna ficou ali, na cozinha gelada, com o aparelho na mão, ouvindo o silêncio deixado por seu filho. O silêncio não era apenas vazio; estava repleto de dor e oportunidades perdidas.
O gotejar da velha torneira ressoava pela casa, como se fosse a única gota de tristeza, cavando cada vez mais fundo no seu coração. O cesto de pão estava vazio, com apenas algumas migalhas no fundo.
Na geladeira, havia apenas uma garrafa de água e um ovo esquecido. Era dia 23, e a aposentadoria só chegaria na próxima semana. Sete longos dias de fome ainda a aguardavam.
Algum dia tudo foi diferente. Naqueles tempos, André ainda a ligava. – Mãe, você vai fazer aquele bolo de queijo? O seu é o melhor! – dizia. Mas agora… agora era só «Não tenho tempo.»
Marianna, lentamente se aproximando do velho fogão a lenha, colocou um copo d’água para ferver.
O chá preto que restou de seu marido agora era apenas um punhado simbólico de lembranças, uma memória que desbotava com o passar dos anos.
O chá não era nada especial, mas para Marianna era o último presente do passado, daqueles anos em que os dias pareciam mais felizes.
Ela sorvia lentamente a bebida amarga, sentada à mesa velha e desgastada, enquanto do lado de fora a vizinha, Dona Panni, ria com seu neto.
O coração de Marianna se apertou, e por um momento ela sentiu como se seus netos já não se lembrassem dela.
O chá acabou devagar, e o cansaço, como um metal frio, penetrava em seus ossos. A casa, a cozinha, os objetos antigos eram apenas lembranças que agora a separavam ainda mais do mundo.
Mas, deixando a xícara de lado, Marianna se levantou de repente, vestiu um velho casaco que já mal servia, e saiu. Foi até o apartamento de seu filho.
Parou diante da porta e pressionou a campainha. Por um momento, nada aconteceu, até que passos suaves se aproximaram, e finalmente a esposa de André, Aneta, abriu a porta, com os braços cruzados e um olhar desconfiado.
– Dona Marianna? – perguntou, como se um fantasma tivesse aparecido diante da porta.
Marianna, apesar do cansaço e da dor profunda, respondeu com voz clara, embora firme.
– Bom dia, Aneta. Preciso falar com você. Vai ser rápido.
Aneta hesitou, mas se afastou, permitindo que Marianna entrasse, embora não a acompanhasse. Não era necessário. Marianna ficou parada na porta, como uma guerreira que não tem mais nada a perder.
– Onde está o André? – perguntou simplesmente.
– Ele ainda está dormindo. Fez plantão à noite – murmurou Aneta.
– Então ele vai acordar. – respondeu Marianna com firmeza.
André, que apareceu na porta, piscando, olhou confuso para sua mãe e sua esposa, enquanto a tensão pairava no ar.
– O que está acontecendo aqui? – perguntou, mas Marianna não respondeu. A resposta já estava dada. As palavras já haviam sido ditas.
Marianna respirou fundo e disse apenas isso:
– Só vim me despedir, filho.
A dor que a consumia há anos se dissolveu naquela decisão tranquila e clara. Ela não implorava mais. Não pedia, não esperava nada. Apenas deu sua voz de volta. Aquela que por décadas foi abafada.
Deixou a porta fechada e saiu para o ar frio lá fora. Mas agora já não sentia tanto frio.
Não era o gelo da solidão que a machucava. Algo havia mudado. Algo que lhe dava esperança. Talvez não fosse um milagre, mas uma oportunidade.
E, finalmente, quando André apareceu para trazer pão fresco e chá, não era importante o que ele trouxera, mas sim o que ele compreendeu: o verdadeiro amor não está nas palavras, mas nos gestos.
Marianna sorriu. O primeiro sorriso genuíno após tantos anos.
Porque, embora nada fosse perfeito, uma coisa importante finalmente aconteceu: seu coração novamente foi capaz de acreditar.