Os anos escorreram como areia entre os dedos, enquanto eu vivia mergulhada numa espécie de isolamento peculiar. Meus filhos me olhavam como se eu fosse uma estranha — como se pertencêssemos a universos diferentes.
O divórcio marcou o fim de uma era — não apenas o término de um casamento, mas o rompimento silencioso do vínculo entre mãe e filhos.
Eles escolheram o lado do pai — um homem influente, respeitado, com quem permanecer era claramente mais vantajoso. E eu? Fiquei só — deixada para trás como esposa, esquecida como mãe.
Pouco tempo depois, eles desapareceram da minha vida. Eu só sabia deles por vozes alheias — relatos de conhecidos que contavam sobre suas vidas ao lado do pai e da nova, jovem esposa dele.
Viagens, jantares refinados, planos ambiciosos…
Enquanto isso, eu habitava meu apartamento silencioso e vazio, e cada nova notícia que chegava era como uma lâmina que me cortava fundo.
Até que um dia compreendi: era hora de viver por mim. Parti para trabalhar fora do país e, pela primeira vez em muito tempo, saboreei a liberdade.
Ganhei o suficiente para reconstruir minha existência. Ao retornar, renovei meu lar, comprei móveis novos, eletrodomésticos modernos e ainda consegui poupar para a velhice.
Enquanto isso, meus filhos formaram suas próprias famílias. Eu ouvia de longe: casamentos exuberantes, crianças, festas cheias de vida.
Até que uma notícia inesperada abalou os alicerces do passado — meu ex-marido faleceu vítima de um infarto. Toda sua herança foi deixada para a jovem esposa.
Meus filhos ficaram com as mãos vazias. A dor deles logo deu lugar a uma ternura repentina — lembraram-se de que tinham uma mãe.
Passaram a aparecer. Trazendo pequenos agrados, perguntando como eu estava. Recebia-os com um sorriso, mas por dentro eu sabia — cada visita escondia um propósito.
Hoje tenho 72 anos. Gozando de boa saúde, cheia de vitalidade e serenidade.
Recentemente, porém, minha filha começou a insinuar, com palavras delicadas, que eu deveria pensar em fazer um testamento — como quem aconselha, mas já reparte o que nem foi perdido.
Com a minha velhice, lembraram que a mãe existe — mas eu não me esqueci de como fui deixada para trás.
Algumas semanas atrás, minha neta — recém-casada — veio me visitar.
— Vovó, não sente solidão aqui sozinha? — perguntou, com um tom doce.
— Não, me sinto muito bem aqui — respondi com tranquilidade.
— É que este apartamento é tão amplo — continuou. — Deve ser cansativo cuidar dele. Talvez eu e meu marido pudéssemos morar com você. Seria mais fácil pra você, e pra nós seria uma bênção — sem aluguel pra pagar.
Sorri. As intenções deles eram tão nítidas quanto vidro limpo.
— Quem disse que não teriam que pagar aluguel? — respondi com calma. — Posso fazer um bom desconto.
Minha neta ficou desconcertada. Claramente esperava que eu abrisse os braços e dissesse: “Levem tudo, fico feliz em oferecer.” Mas eu tinha outros planos.
Há alguns anos escrevi meu testamento. Está claro: meu apartamento será vendido após minha morte, e o dinheiro doado a uma fundação que cuida de crianças enfermas.
Quando minha filha soube disso, ligou tomada pela fúria.
Gritou ao telefone, acusando-me de injustiça, dizendo que estava roubando o futuro dos netos. Logo depois, meu filho apareceu, de repente disposto a cuidar de mim. Mas esse afeto repentino não me comoveu.