Dizem que só conhecemos verdadeiramente alguém quando dividimos o mesmo teto.
Eu achava que sabia tudo sobre minha sogra, Cordelia – até o dia em que decidi segui-la em segredo. O que descobri fez minha visão de mundo virar de cabeça para baixo.
Ela não escondia um simples segredo, mas algo que mais parecia uma bomba-relógio, prestes a devastar tudo à nossa volta.
Minha rotina era como um relógio suíço: precisa, organizada, sem surpresas.
Como designer gráfica freelancer, eu trabalhava confortavelmente de casa, enquanto Xander, meu marido, se dedicava com afinco ao seu escritório de advocacia.
Os dias eram serenos, e o silêncio da casa era meu companheiro constante.
Isso mudou quando Cordelia, depois da morte do marido, veio morar conosco. Uma noite, ela me ligou, sua voz carregada de tristeza:
“Olivia, minha querida… não aguento mais ficar sozinha. A casa está tão vazia, tão fria… Eu preciso de vocês.”
Xander e eu nos entreolhamos, compartilhando a mesma preocupação silenciosa. Após quatro décadas de casamento, perder o parceiro parecia uma dor insuportável.
Parecia justo acolhê-la nesse momento difícil.
Mas desde que Cordelia cruzou a porta de nossa casa, algo se desencaixou. Era como se sua presença trouxesse uma energia estranha, algo que não conseguíamos nomear.
Ela nunca foi uma mulher comum. Sempre houve algo peculiar nela, mas agora, suas excentricidades tinham ganhado uma nova intensidade.
Toda quinta-feira, antes do sol nascer, Cordelia saía de casa e só voltava tarde da noite. Quando entrava pela porta, suas roupas traziam um cheiro insuportável – um odor pútrido, que evocava a imagem de algo morto e esquecido.
Aquele cheiro se espalhava pelo ambiente como uma sombra invisível, impregnando as paredes e meus pensamentos.
Eu não conseguia entender: onde ela ia? O que fazia? E o que, pelo amor de Deus, causava aquele fedor insuportável?
“Por onde você andou hoje, mãe?” – perguntou Xander uma tarde, quando ela retornou e evitava encarar qualquer um de nós.
Eu estava na cozinha, mexendo uma panela, mas a atenção estava toda na resposta dela.
“Ah, estive com umas amigas antigas”, respondeu, com um gesto despreocupado e um sorriso que parecia mais forçado do que sincero.
“Todas as quintas-feiras?” – questionei, meu tom carregado de ironia. “Esse grupo deve ser mesmo muito especial.”
Ela me lançou um olhar profundo, quase desafiador, antes de dar de ombros.
“Nos encontramos regularmente. Faz bem conversar com pessoas que conhecem sua história.”
Mas aquele cheiro – era tudo, menos normal. Parecia que ela havia mergulhado num esgoto ou atravessado um lixão.
O odor persistia no ar, como um visitante indesejado que se recusava a ir embora.
Era uma mistura de podridão e algo indescritível, tão ruim que até palavras pareciam insuficientes para defini-lo.
Minha curiosidade crescia, uma fome voraz que eu não conseguia controlar. A cada quinta-feira, o desejo de saber a verdade se tornava insuportável.
Numa quarta-feira à noite, decidi que não podia mais esperar.
“Xander” – sussurrei, cutucando-o levemente para acordá-lo. “Você realmente acredita nessa história da sua mãe?”
Ele piscou algumas vezes, tentando espantar o sono. “Que história?”
“Das ‘amigas antigas’” – respondi, minha voz saindo quase como um sussurro. “Toda quinta-feira? E aquele cheiro horrível? Isso não te parece estranho?”
Ele suspirou, sentando-se na cama com expressão cansada. “Talvez seja o jeito dela de lidar com o luto, Olivia. Cada um processa a dor à sua maneira.”
Fechei os olhos, tentando conter a irritação. “E que tipo de luto envolve cheirar a lixo?”
Ele riu, mas era um riso vazio, de quem não queria prolongar o assunto. “Amor, você está vendo coisas onde não existem. Relaxa.”
Mas eu sabia que não era coisa da minha cabeça.
Aquilo estava ali, pulsando como um segredo sombrio, cada vez mais difícil de ignorar. Alguma coisa estava escondida sob a superfície, e eu estava determinada a descobrir.