O vento caminhava pelo cemitério como uma antiga canção de ninar esquecida num vilarejo distante.
Os velhos choupos sussurravam enquanto se curvavam sobre o caminho estreito que levava às sepulturas mais antigas – pedras cobertas de musgo, onde os nomes haviam se apagado sob os dedos úmidos do tempo.
No ar, misturava-se o cheiro de mofo e folhas caídas.
Gabriel, de seis anos, ajoelhava-se diante de uma sepultura simples, pálida. Seu casaco, dois números maior, estava abotoado até o queixo, mas mesmo assim ele tremia de frio.
Seus dedos avermelhados apertavam com força a grama úmida, sem perceber que a arrancava.
Seus olhos estavam fixos na terra recém-revolvida, como se esperasse dali uma resposta.
— Ela não se foi — murmurou com a voz trêmula. — Eu sei que está aqui. Ouço a voz dela…
Gabriel chorava, o rosto virado para o chão, implorando: — Por favor… ela não morreu! Ela está viva!
Apenas o barulho distante de um trator e o rangido do portão do cemitério, empurrado pelo vento, responderam.
Então, surgiu um homem, um visitante de meia-idade — Roberto Touro, que todos os anos, nesse mesmo dia, visitava o túmulo da irmã para lhe dizer tudo o que nunca conseguiu enquanto ela vivia.
Mas seus passos cessaram. O menino — sozinho, ao lado de um túmulo recente, sussurrando para a terra como se esperasse uma resposta — o fez parar.
Roberto aproximou-se lentamente, parando à sombra de um carvalho. Não queria perturbar. Mas havia algo no garoto — uma firmeza silenciosa, uma dor contida — que parecia esconder um segredo.
Na lápide, lia-se um nome: Éva Konstantinov. Sem flores, sem retrato, apenas uma pedra cinzenta e uma data — o enterro havia ocorrido há menos de duas semanas.
Roberto se aproximou.
— Olá — disse com suavidade.
O garoto se sobressaltou, mas não fugiu. Levantou os olhos — estavam vermelhos de tanto chorar — e perguntou baixo:
— Você sabe como dá pra saber se alguém ainda respira lá embaixo da terra?
Roberto ficou paralisado. Depois sentou-se ao lado dele, sentindo o frio atravessar o tecido do casaco.
— Não — respondeu com cautela. — Mas uma criança não deveria se preocupar com coisas assim.
Gabriel apertou os lábios. Sua voz saiu cortante, como se já não fosse de um menino:
— Disseram que minha mãe dormiu ao volante. Mas ela nunca dirigia cansada. Nunca! E não deixaram eu me despedir dela. Nem uma vez.
Roberto olhou para a sepultura. A terra ainda não havia assentado por completo.
— Quem disse isso? — perguntou.
— Os colegas dela — respondeu o menino, após uma pausa. — O senhor dos dedos grandes e a moça que sorri mesmo quando está brava.
— Você sabe os nomes deles? — perguntou Roberto.
— O senhor é o Lajos Grosz, e a moça é Ilona Szomódi — assentiu o garoto.
Roberto franziu o cenho. O nome de Lajos Grosz lhe era familiar. Um antigo apoiador do asilo que ele dirigira. Palavras pomposas, reputação ilibada… mas sempre houve algo inquietante nele.
— Por que você acha que sua mãe está viva? — perguntou Roberto.
Gabriel encostou a palma da mão na terra.
— Porque sonhei com ela. E no sonho ela me chamou. Disse que não foi embora.
O vento cessou. Uma folha pousou sobre a lápide, depois alçou voo e desapareceu no ar.
— Minha irmã também aparecia nos meus sonhos quando eu tinha sua idade — disse Roberto. — Ela morreu. Eu tinha sete anos.
Gabriel ergueu o olhar.
— Você acreditava nela quando dizia isso?
— Não — sorriu amargamente Roberto. — Diziam que era só imaginação.
Silêncio. Dois estranhos, unidos pela mesma dor — e por aquele tipo de silêncio que a maioria das pessoas não consegue suportar.
Então Gabriel perguntou, quase sem som:
— Se alguém é enterrado só pra sumir, isso é assassinato, não é?
Roberto fitou o menino, e nos olhos dele viu não só tristeza, mas algo mais profundo — traição. Um fardo que nenhuma criança deveria carregar.
— Sim — respondeu baixinho. — E se for verdade, alguém precisa saber disso.
— Então precisam desenterrar. Por favor — sussurrou Gabriel.
Roberto se levantou. Não sabia o que dizer. Suas mãos tremiam sem que percebesse o motivo.
Foi quando passos ecoaram. Era Gizela, a zeladora do cemitério, que cuidava das flores. Trazia um regador nas mãos e um rosto marcado por tudo o que já vira.
— Ele vem aqui todo dia — disse Gizela, olhando para Gabriel. — Senta em silêncio e repete que a mãe dele não morreu como dizem.
Roberto balançou a cabeça, sentindo um nó na garganta.
— Talvez ele tenha razão — disse por fim.
E naquele instante, algo se partiu no coração de Roberto. Não por tristeza, mas por clareza: há histórias que se repetem — com outras crianças, em outros dias, diante de outras lápides. E agora, nem ele virou as costas.
Roberto Touro nunca falava sobre sua infância — nem nas entrevistas dos jornais locais, nem nos eventos beneficentes, nem em sua casa à beira do rio, naquele canto silencioso.
As pessoas achavam que sua reserva era fruto da criação. Mas era uma memória. E existem portas que, uma vez fechadas, escondem histórias. Especialmente quando alguém diz: “Precisamos cavar.”